terça-feira, 8 de setembro de 2009

Eu sou de todo mundo e todo mundo é meu também

Quando fui para o Brasil da última vez (que foi a primeira e única desde que eu me mudei de lá) eu estava com muito medo de ir. Queria até adiar a viagem uns quatro dias para ver se ganhava tempo. E, para isso, arrumei todas as desculpas possíveis, entre elas: vou perder DUAS aulas, não estou com o visto sueco estampado no meu passaporte novo, a Shannon vai defender a tese dela e (essa é a pior) não vai dar tempo de arrumar mala e de comprar presente para os meus queridos. Acho que se não fosse o fato de a minha mãe ter sido baleada dois meses antes, eu nem teria ido.

Graças às minhas amigas Cigdem e Linda eu fui na data que havia marcado nove meses antes. Elas refutaram todas as minhas desculpas esfarrapadas, me fazendo ver que nenhuma tinha cabimento e se ofereceram para me ajudar no que fosse preciso, inclusive para arrumar a minha mala, e para ir às minhas aulas tomar notas. Quase me colocaram dentro do avião. São uns amores! A Cigdem, especialmente, foi* muito importante para mim nessa vida nova. Sempre sincera e assertiva, ela foi responsável por me dar umas sacudidas e me trazer de volta para a realidade muitas das vezes que eu estava zumbizando lá por Lund.

Mas, voltando... Outro dia eu estava falando desse medo todo para um amigo e ele me perguntou por que eu estava com medo de ir. Eu não soube responder. Ele, no dia, me perguntou se eu estava com medo de não querer voltar. Eu disse que não. E não estava mesmo, porque eu negava e nem queria perceber o tamanho da minha saudade do Brasil.

Mas a pergunta dele não quis calar e ficou como um sininho tocando na minha cabeça. Só parou dias depois, quando eu estava voltando de um shopping em Bangcoc. Eu estava no táxi e, por causa do engarrafamento, devo ter demorado quase duas horas pra chegar no hotel, então aproveitei esse tempo pra refletir. Não me lembro a seqüência de reflexões que me trouxeram a essa conclusão, mas finalmente eu entendi o medo e o sino se apagou. O meu maior medo era de que as pessoas tivessem se esquecido de mim. Ou de eu estar tão diferente que as pessoas não mais me reconheceriam. Ou pior, eu estava apavorada pelo medo de que mesmo após superado o rápido e normal estranhamento (re)inicial, não gostassem mais de mim, seja lá o que for que eu havia me tornado.

Tinha medo de não pertencer mais... de não sentir mais que eu faço parte.

Tinha medo de ter de novo a desconfortável e apavorante sensação de não ter onde caber, que tive quando me mudei de Uberlândia e antes que Brasília se tornasse parte homogênea de mim. Sentimento seco e acidentado de não pertencer mais a canto nenhum do mundo.

Mas... eu encontrei essas pessoas de quem eu estava com tanto medo. E, quando as encontrei, eu vi os seus olhos. E nos olhos que vi não enxerguei estranhamento de nenhuma fração de tempo perceptível à minha humanidade. Enxerguei sim, em cada par de olhos , o reflexo dos meus próprios. E à medida que ia encontrando cada olhar, eu , que estava perdida e fragmentada, encontrava meus pedaços escondidos. E, depois disso, tudo fez sentido, assim mais ou menos:

“(…)

You've got this look I can’t describe,

You make me feel I’m alive

When everything else is all fade

Without a doubt you’re on my side

Heaven has been way too long

Can’t find the words to write this song

(…)” Like a Star, Corinne Bailey Rae

Quando retornei à Suécia, também encontrei olhos: diferentes, coloridos e rasgados. E eles continham os pedacinhos que faltavam. Pedaços bem menores, sem dúvida, mas bastante complexos e essenciais na minha composição.

E foi a junção de todos esses olhares que me fizeram inteira de novo. Até o meu sono eles devolveram. Foi como se, ao ver seus olhos abertos, eu pudesse descansar os meus.

E eu concordei com Murilo Rosa e Chico Pinheiro: "A minha casa está onde está o meu coração". E, ao invés de me sentir sem lugar porque no meu coração estão coisas, lugares e pessoas tão diferentes, dessa vez eu senti o contrário. Senti que meu lugar não é só um, meu lugar são vários e isso... É BOM DEMAIS!

Então, meus amigos (muito, muito, muito) queridos... Muito (muito, muito, muito) obrigada por vocês existirem e por me enxergarem quando me olham. Amo (muito, muito, muito) vocês.

*Digo foi porque ela terminou o curso agora e se mudou da Suécia. Vou sentir saudades muito doídas dela.

P.S.: Percebi agora que esse é um blog principalmente dedicado às pessoas e à sua importância na minha vida.


Entre Bangcoc e Phuket, 27 de julho de 2009.

Nenhum comentário: